ONU pede ao Brasil medidas contra transgênicos

Denúncia apresentada pela Via Campesina em Genebra pede proibição dos cultivos por colaborar para o empobrecimento da população e a concentração de terra

O relatório foi elaborado por Antônio Andrioli, professor do Instituto de Sociologia da Universidade Johannes Kepler, na Áustria, e do Mestrado em Educação nas Ciências da Unijuí, no Rio Grande do Sul. Além dos próprios estudos, ele tomou como base a determinação de 2008 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU que considera que o uso de transgênicos na Índia constitui uma violação aos direitos humanos. No país asiático, há claros sinais de que esse tipo de cultivo contribui para a concentração fundiária, o empobrecimento e a contaminação do solo.

O tema apresentado no início de maio em Genebra aponta que há violação ao Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas, documento que prevê que situações relacionadas à alimentação, aos problemas ambientais e de auto-determinação dos agricultores possam ser entendidos como um desrespeito aos direitos humanos. 

Agora, nesta sexta-feira (22), o comitê deve apresentar as medidas que o Brasil precisa tomar. Em entrevista a Rede Brasil Atual, Antônio Andrioli defende, além do veto imediato às culturas transgênicas, que o governo tenha que garantir às populações mais pobres o acesso a alimento, água limpa e saúde.  

O professor considera que o uso de transgênicos, do ponto de vista fundiário, é um desastre. Em primeiro lugar, a aplicação cada vez maior de herbicidas contamina a água e o solo, forçando pequenos agricultores que vivem ao redor de propriedades monocultoras a deixarem suas terras. Além disso, os transgênicos só são viáveis em grandes propriedades, o que estimula a compra de terras e as culturas para exportação.

Dessa forma, agricultores que antes produziam a própria subsistência passam a vender para o exterior, já não são mais auto-suficientes e diminuem a oferta de alimentos no mercado nacional. Há um terceiro aspecto, que é a eliminação de postos de trabalho devido ao uso de agrotóxicos em larga escala. Antônio Andrioli destaca que “o governo brasileiro exporta soja e muitas outras monoculturas. É com esse dinheiro que financia programas sociais que diminuem a pobreza, mas aumenta o número de sem-terra e o de agricultores que deixam de produzir a própria comida”.

Agrotóxicos

Recentemente, Brasil e União Europeia cortaram os impostos sobre a importação do glifosato chinês. Trata-se de um princípio ativo de herbicida que interrompe o metabolismo das plantas de forma que elas acabam morrendo. Nos primeiros anos, o Roundup, marca da Monsanto para um composto de glifosato e outros produtos, teve eficiência para aquilo que queriam os produtores: matar ervas daninhas.
Mas logo os efeitos se mostraram muito mais potentes que o imaginado: o composto, além de contaminar o solo, fica impregnado no produto final.

No caso da soja brasileira, hoje a concentração de glifosato chega a 33 miligramas por quilo. Antes da liberação de transgênicos, o percentual máximo permitido era de 0,2 miligrama. Estudos conduzidos nos Estados Unidos mostram que, em seres humanos e em animais, o Roundup produz acumulações pulmonares, aceleração da respiração, náuseas, reações alérgicas, perda de função dos rins e problemas de esterilidade. 

A introdução do glifosato provocou também a morte de sapos na Argentina, aumentando o número de mosquitos transmissores da dengue – este ano, o país enfrenta uma epidemia da doença. 

A resposta do Brasil

O governo brasileiro, pela Secretaria de Direitos Humanos, apresentou sua resposta quatro dias depois da denúncia feita por Andrioli e pela Via Campesina. O professor aponta que a contestação do ministro Paulo Vannuchi foi completamente insatisfatória: “voltamos a um período em que o uso de transgênicos não estava relacionado à violação de direitos humanos.

No ano passado, a resolução da ONU sobre a Índia acabou com isso. Sabemos que nosso primeiro passo foi ignorado pelo governo brasileiro. Ele apenas se referiu a outros problemas de direitos humanos, mas não abordou o problema dos pequenos agricultores e muito menos a relação disso com a reforma agrária, com o desmatamento”.