Presídio que rendeu denúncia internacional ao Brasil continua superlotado

Juiz que determinou interdição de Urso Branco (RO) afirma que prisão está sob controle, mas tem diversos problemas e não garante o princípio básico da ressocialização do detento

O Presídio de Urso Branco rendeu denúncia internacional ao Brasil (Foto: Luiz Paulo – Tribunal de Justiça de Rondônia)

As denúncias dos últimos dias em relação aos presídios do Espírito Santo reativaram dentro do governo o temor de que o país volte a sofrer processos internacionais. A Casa de Detenção José Mário Alves, conhecida como Urso Branco, traz uma experiência amarga para o Estado brasileiro, já que se trata da primeira denúncia a qual o Brasil responde na Corte Interamericana de Direitos Humanos (ver box).

A resistência do governo de Rondônia em relação à tomada de atitudes suscitou conversas dos ministros Tarso Genro e Paulo Vannuchi com o governador Ivo Cassol, que chegou a dizer que a situação não é diferente da de outros estados. Em 2008, a Procuradoria-Geral da República aceitou o pedido de intervenção federal no caso – o processo aguarda autorização do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o relatório encaminhado ao procurador Antônio Fernando de Souza, as condições do presídio violavam os direitos humanos, com várias ocorrências de tortura. Em outubro de 2006, os presos ficaram expostos ao sol e ao relento durante seis dias seguidos sem poder sair do lugar em hipótese alguma.

Histórico de Urso Branco
O caso julgado internacionalmente é de uma chacina de 2002, quando 27 pessoas morreram, mas o histórico de violações dentro do presídio não parou por aí. Os casos mais marcantes foram outros dez assassinatos registrados ao longo do mesmo ano, mais 17 em 2004 e 10 em 2005. Em toda a história, Urso Branco tem pelo menos cem mortes violentas.

Em entrevista a Rede Brasil Atual, o juiz titular da Vara de Execuções e Contravenções Penais de Porto Velho, Sérgio William Domingues Teixeira, aponta que a simples ameaça de intervenção federal no ano passado gerou mudanças na postura do governo estadual: “nós tínhamos extrema dificuldade para discutir a ampliação de vagas, não se resolvia nada. Bastou que houvesse o pedido de intervenção para ser criada uma força-tarefa, já foram aprovadas duas novas unidades prisionais na capital”.

Mesmo assim, a situação de Urso Branco está longe do ideal. No ano passado, quando a população da penitenciária ultrapassou o número de 1.300 – em um espaço para 456 –, o juiz determinou que nenhum outro detento poderia ingressar no local. Hoje, o espaço abriga 915 internos. “Na verdade, a interdição resolveu o problema da entrada de presos, mas continua superlotado, tem diversos problemas de ordem funcional e administrativa. Pelo menos é um presídio mais controlado, embora não atinja ainda a finalidade de reinserção do preso, não se trabalhe os processos ressocializantes que a pena determina”, destaca Sérgio William Domingues Teixeira.

“Na verdade, a interdição resolveu o problema da entrada de presos, mas continua superlotado, tem diversos problemas de ordem funcional e administrativa. Pelo menos é um presídio mais controlado, embora não atinja ainda a finalidade de reinserção do preso, não se trabalhe os processos ressocializantes que a pena determina”

Ainda que não tenha estudado a fundo o caso dos presídios de Espírito Santo, o juiz conhece bem a situação de violação da dignidade humana. E aponta que, frente a um pedido de intervenção federal, há duas saídas: assumir a culpa e trabalhar para melhorar a situação ou negar a questão e permitir que o desrespeito continue ocorrendo. No caso capixaba, o secretário de Justiça, Ângelo Roncalli, finalmente admitiu o problema, mas acredita que há exagero nas denúncias de casos de mutilação e pede o nome de todas as vítimas.

Em síntese, a declaração é a mesma que consta em relatório de 2006: “não se pode resolver os problemas da noite para o dia”. Como denunciou um ativista de direitos humanos a Rede Brasil Atual, o caso tem pelo menos uma década.

Pedido internacional

Em Rondônia, a ação movida na Organização dos Estados Americanos (OEA), com o posterior encaminhamento do processo para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, gerou movimentação, embora as soluções não tenham vindo até hoje. Imediatamente foi montada uma comissão de monitoramento do presídio com integrantes do Ministério Público Federal, do Itamaraty, do Ministério da Justiça e de vários órgãos estaduais.

Na tentativa de mostrar que há uma reação do Estado à situação, a comissão determinou recentemente que um delegado fique responsável por dar andamento às investigações sobre a chacina de 2004, que ainda se encontra em fase de inquérito. Sobre as 27 mortes de 2002, neste mês foram pronunciadas 49 pessoas, entre elas alguns agentes penitenciários. A expectativa do juiz Sérgio William Domingues Teixeira é de que as primeiras sentenças sejam proferidas até o fim do ano.

Leia também

Últimas notícias