Histórico

Ato celebra o 9 de julho. O de 1917, não o de 1932, para lembrar o movimento operário

Movimentos, pesquisadores, sindicalistas e políticos relembram a primeira greve geral no país e seus desdobramentos históricos

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Funeral do sapateiro José Martinez em 1924: comoção na cidade

São Paulo – Pelo quarto ano seguido, movimentos, entidades e pesquisadores celebram, em São Paulo, o Dia da Luta Operária, institucionalizado por lei municipal em 2017 (Lei 16.634). Desta vez, o ato não pode ser realizado em um galpão no bairro do Brás, por causa da pandemia. Assim, três mesas virtuais discutem nesta quinta-feira (9) aspectos históricos da greve geral de 1917 na cidade de São Paulo.

Autor do projeto que originou a lei, o vereador paulistano Antonio Donato (PT) lembra que o assassinato do sapateiro José Martinez, em 9 de julho de 1917, deu contorno ainda mais dramático àquele movimento. Seu funeral provocou concentrações acima de 50 mil pessoas. Isso em uma cidade com aproximadamente 200 mil habitantes. “A data também é um contraponto à celebração oficial que a burguesia paulista celebra desde 1932”, acrescenta o vereador.

“Aqui (em São Paulo) se comemora o 1932″, que é uma festa de caráter reacionário”, acrescenta o ex-senador italiano e pesquisador José Luiz del Roio. Ele define o movimento constitucionalista como uma luta envolvendo a oligarquia. “O dia 9 de julho de 1917 representa exatamente o oposto. O sangue, a luta, o suor da classe operária”, afirma.

Vitória e repressão

Ele destaca algumas “curiosidades históricas” sobre a greve de 1917. Foi um movimento fundamentalmente feminino, devido à grande presença de trabalhadoras na indústria têxtil, por exemplo. E na comemoração ao final, já que a paralisação foi considerada vitoriosa, pela primeira vez se cantou A Internacional publicamente.

Aos poucos, os trabalhadores, mesmo vitoriosos, foram sofrendo retaliações. “Demissões, processos injustos, deportações, mortes”, cita del Roio. “Foi uma repressão muito forte.” E ainda houve a epidemia de gripe espanhola – cujo nome não tem a ver com a origem, mas com o país de onde a doença começou a ser divulgada –, que atingiu as classes mais pobres.

O jornalista, professor e historiador Moacir Assunção falou sobre o movimento de 1924, ocorrido também em julho, e uma espécie de “continuação” do ocorrido em 1917. Desta vez, foi uma rebelião deflagrada por jovens militares, a “segunda rebelião tenentista”, também chamada de “revolução esquecida”, como lembra o pesquisador, que em 2015 lançou livro sobre o tema (São Paulo deve ser destruída, editora Record).

Rebelião na cidade

Trata-se de uma revolta contra o governo central, do presidente Artur Bernardes. Mobilizou vários quartéis da Força Pública (o equivalente à PM hoje, mas com características de exército), levando o presidente estadual (cargo correspondente ao de governador), Carlos de Campos, a se refugiar.

“Embora não seja uma revolução dos trabalhadores, eles oferecem seu apoio moral e até mesmo material à rebelião”, conta Assunção. Dias depois, acrescenta, “começará o mais cruel bombardeio que São Paulo viu”. Esses bombardeios aconteceram em áreas de grande concentração operárias, com Brás, Mooca, Ipiranga e Cambuci. Pelo menos 500 pessoas morreram, 4.500 ficaram feridas. Seguiu-se uma “duríssima repressão” aos trabalhadores. “Tinha consciência de que aquela revolta não era deles, mas se identificaram com a revolta dos jovens militares”, lembra o professor. Ele dá o exemplo de Miguel Costa, da Cavalaria, que havia participado da repressão à greve de 1927 e sete anos depois tornou-se um dos líderes da rebelião.

As atividades de hoje vão continuar durante a tarde e à noite. Primeiro, com um debate sobre a participação da Volkswagen na colaboração com a ditadura instalada em 1964. O evento termina com uma mesa incluindo representantes das centrais sindicais. As atividades são transmitidas on-line pelas páginas do Facebook de Donato, do ex-deputado Adriano Diogo e dos Jornalistas Livres.


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