Superação

Em novo disco, Fabio Brazza encara depressão e alcança reencontro artístico

“Isso Não é um Disco de Rap” faz releitura de obras de René Magritte e apresenta nova estética musical

Alex Takaki/Divulgação
Alex Takaki/Divulgação

São Paulo – “Eu me sentia num labirinto secreto, sem saída.” O rapper paulistano Fabio Azeredo, conhecido como Fabio Brazza, lançou seu quinto álbum Isso Não é Um Disco de Rap. Mais do que rimas de protesto, o trabalho traz um significado maior: a vitória contra a depressão e um reencontro artístico.

Seu novo projeto é um teste, onde busca por uma nova sonoridade e o prazer de fazer música. Por isso, o disco ainda traz duas releituras das obras do artista surrealista belga René Magritte: A Traição das Imagens e O Filho do Homem.

“É justamente desafiar as pessoas a ver além do que estão vendo, assim como o surrealismo de Magritte propunha. Tudo que mostramos esconde algo por trás, isso se aplica à arte do Fabio Brazza, que possui sentimentos além da música”, explica o rapper à RBA.

Crescido nas batalhas de rima e alavancado pelas poesias sobre futebol, Fabio Brazza acredita que essa parte de sua trajetória o aprisionou. “O futebol e os poemas nas redes sociais impulsionaram meu trabalho, mas me colocaram numa única prateleira. Com o tempo, fui provando que era mais que aquilo. Antes, eu tinha raiva de fazer rima de futebol, porque criou uma frustração, mas, hoje, consigo ter gratidão por essa oportunidade”, afirma.

Experimento

Em 12 faixas, Fabio Brazza abusa de diversas sonoridades e estéticas: vai do samba ao trap – subgênero do rap. O objetivo, segundo ele, foi sair da zona de conforto, por isso a escolha de gravar com produtores mais jovens: Paiva e Pedro Lotto.

“Eles colocaram uma roupagem mais moderna. Eu precisava disso, porque minha influência é voltada aos anos 90, então adaptei isso ao meu discurso”, explica.

Desde o começo da carreira, Brazza experimenta diversas musicalidades. Em 2016, lançou o álbum Tupi or Not Tupi, misturando o rap com samba. No ano seguinte, apresentou um novo trabalho, mas só com batidas secas, o É Ritmo, Mas Também é Poesia.

Entretanto, cansado das rimas, decidiu fazer um álbum acústico, e 2018, o Colírio da Cólera. Segundo ele, esses experimentos servem para encontrar um caminho uniforme no futuro. “Cada projeto é uma tentativa de me reinventar. O próximo passo é entender onde acertei nesses testes, para me permitir ir mais longe e encontrar minha identidade”, acrescentou.

Depressão

O último trabalho foi criado durante um período difícil de sua vida. Desde o ano passado, enfrenta a depressão. Em uma das músicas novas, relata esse turbilhão de sentimentos negativos: “Logo eu que dizia fazer feat com Deus / Hoje faço feat com os meus Demônios”, rima em “Inquilina da Dor”.

Ele, que se diz uma pessoa alegre e para cima, tomou um baque ao se encontrar nessa situação. Apesar do momento, Brazza relata que conseguiu converter suas angústias em arte, o que ajudou na enfrentar a doença.

“A dor é a casca do autoconhecimento se quebrando. Eu precisava disso para evoluir como pessoa e artista. Isso me deu mais sensibilidade e me permiti ser mais vulnerável aos meus sentimentos. Nietzsche fala que todo universo precisa do caos para dar luz à uma estrela dançante; foi no meio desse caos que dei luz às minhas estrelas, mas em formas de ritmo e poesia”, disse.

Política

Fabio tem a rima correndo em seu sangue. Neto do poeta concreto Ronaldo Azeredo e sobrinho neto do também poeta Augusto de Campos, o artista afirma que sua paixão pelos versos começou por esse histórico familiar.

“O mais importante da relação com meu avô foi a introdução à arte e o acesso ao mundo da literatura. Eu bebi de muitas fontes, além da poesia concreta, como o samba. Tudo que meu avô lia eu queria também ler”, relembra.

A partir da semente plantada por seu avô, ele emergiu na cultura hip-hop. O artista acredita que o rap ajuda a mudar sua visão sobre o mundo. “O rap é uma luta, uma missão, então foi a minha forma de devolver meu privilégio em ritmo e poesia, em arte”, acrescenta.

Com a ascensão do fascismo com a eleição de Jair Bolsonaro, Brazza lembra que os valores do hip-hop são totalmente contrários ao dos presidente. “A gente vive um momento delicado e triste. É um movimento fascista global, com ideias ufanistas e nacionalistas, tentando invocar um passado perigoso”, lamenta.

Apesar disso, Fabio Brazza afirma que o atual presidente é reflexo de uma elite acuada e acredita numa mudança positiva a curto prazo. “Essa mentalidade branca e colonial vai acabar. Apesar do Bolsonaro ter ganhado força, isso é motivado pela fragilização do status quo, então acredito que o fascismo não durará muito tempo”, finaliza.


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