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Cidadania italiana de Bolsonaro pode ser barrada por emenda que avança em Roma

Texto estabelece critérios para a concessão da cidadania italiana. Entre eles, a prática de crimes dos quais Bolsonaro é acusado, como conspiração política e contra o Estado

Marcos Corrêa/PR
Marcos Corrêa/PR
"Se o governo der a cidadania aos filhos de Bolsonaro ou mesmo ao ex-presidente, será um fato de gravidade sem precedentes para a democracia", avalia autor da emenda

São Paulo – O parlamento da Itália aprovou em primeiro turno emenda que pode barrar a concessão de cidadania italiana a Jair Bolsonaro (PL). Por 191 votos a 6, deputados deram aval na última quinta-feira (26) à iniciativa do deputado Angelo Bonelli, da Aliança Verde Esquerda, que visa impedir os “efeitos danosos para a democracia” diante de uma possível concessão da nacionalidade ao ex-presidente. As informações são do jornalista Jamil Chade, em sua coluna no portal UOL.

Para que entre em vigor, o texto ainda precisará passar por uma segunda votação no parlamento. A previsão é que seja aprovado, dado o amplo apoio que alcançou no primeiro turno. Na Itália, o acesso à cidadania é garantido por direito sanguíneo. A emenda apresentada por Bonelli destaca, contudo, que o governo italiano se comprometerá a “avaliar a conveniência de rejeitar o pedido de cidadania italiana, mediante a introdução de alterações legislativas à lei número 91 de 5 de fevereiro de 1992”.

Isso inclui “aqueles que forem condenados, inclusive no exterior, por crimes de violência doméstica, violência contra a mulher, crimes de terrorismo, crimes de violência sexual e pedofilia, crimes de crime organizado, crimes de tráfico de drogas e conspiração política e contra o Estado”, detalha o texto. A partir dessas considerações, a cidadania do ex-presidente pode ser barrada. Bolsonaro está entre as 61 pessoas alvo de um pedido de indiciamento da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigou os atos golpistas de 8 de janeiro.

Bolsonaro réu

De acordo com o relatório final do colegiado, o ex-presidente deve responder por associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado. Em julho, Bolsonaro também foi declarado inelegível por oito anos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por proferir mentiras sobre o sistema eletrônico de votação do país e atacar ministros da Justiça Eleitoral. O que foi entendido pela Corte como abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.

Em entrevista a Jamil Chade, o deputado italiano explicou que ao pensar no texto da emenda “o caso Bolsonaro me veio à mente imediatamente”. “A Itália não pode permitir que pessoas que tenham conspirado contra o Estado possa ter a cidadania reconhecida. Isso não faz bem para a nossa Democracia”, justificou Bonelli. “A aprovação da emenda é importante porque empenha o governo a modificar a lei que introduz o veto para a aquisição da cidadania diante a esses crimes.”

O deputado lidera o processo desde o ano passado, quando foram divulgadas suspeitas de que os filhos do ex-mandatário, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), teriam furado a fila para pedir a cidadania à Itália e fugir do Brasil diante das suspeitas de cometimento de crimes pelo clã. Na ocasião, Bonneli cobrou respostas do Ministério de Relações Exteriores do país sobre se a cidadania seria concedida ou não.

Democracia em risco com concessão

No pedido, o parlamentar incluiu questionamentos quanto à origem do dinheiro da família Bolsonaro, que protagonizava o escândalo dos 51 imóveis comprados com dinheiro vivo. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Tajani, afirmou no final do ano passado que apenas os filhos tinham entrado com o pedido. Bonneli esteve à frente ainda de questionamentos quanto à concessão da cidadania honorária dada pela prefeitura de Aguillara Veneta ao ex-presidente. A cidade é a de origem dos antepassados de Bolsonaro.

“Se o governo der a cidadania aos filhos de Bolsonaro ou mesmo ao ex-presidente, será um fato de gravidade sem precedentes para a democracia”, avalia o deputado italiano.

‘Déjà vu de Trump’

Ainda de acordo com a coluna, apesar do governo de extrema-direita de Giorgia Meloni, apoiado por aliados da família Bolsonaro, há uma forte pressão em Roma contra qualquer gesto que favoreça Bolsonaro. O país também não tem interesse de se indispor com o Brasil, um parceiro comercial. Durante a breve passagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela Itália, inclusive, Meloni chegou a se reunir com Lula como prova do “pragmatismo” entre as duas economias.

Na Itália, Bolsonaro também é alvo de diversas críticas. Como as proferidas pelo jornal Corriere della Sera, em fevereiro, que chamou o ex-presidente de “déjà vu de Trump” devido ao mesmo discurso de mau perdedor na disputa com Lula. “Bolsonaro não é Trump: ele só fala 20 minutos. Mas algumas frases são déjà vu”, dizia o jornal.

Redação: Clara Assunção