O absurdo não é normal

Reações às falas de Bolsonaro marcam repúdio ao presidente, mas também oportunismo político

Ex-vice-presidente da Comissão da Anistia ressalta que, apesar de as motivações serem distintas, é preciso indignação inclusive das forças que já apoiaram chefe do Executivo

Governo do Estado de São Paulo
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No impeachment de Dilma ou mesmo já como presidente, Bolsonaro destacou sua afinidade com a ditadura civil-militar, mesmo assim, contava com apoio de Doria, por exemplo, que agora considera as declarações "infelizes"

São Paulo – Para o ex-vice-presidente da Comissão da Anistia José Carlos Moreira, sócio fundador da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), é preciso fazer uma leitura do jogo político mesmo para avaliar as críticas contra o presidente Jair Bolsonaro, após declarações dirigidas ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz. Em entrevista à Rádio Brasil Atual, Moreira pondera que são diferentes os motivos que explicam as reações de determinados atores políticos, mas afirma que mesmo o reconhecimento de quem já apoiou Bolsonaro é necessário para impedir que “os absurdos que vêm acontecendo” sejam normalizados.

“No cenário atual que nós vivemos, acredito que algumas pessoas se manifestaram por oportunismo, já de olho nas futuras eleições, querendo se apresentar como uma força política distinta, que concorda com algumas das pautas levadas a diante pelo governo, mas não concorda com determinadas manifestações que são repudiadas não só no país, mas no mundo inteiro, por pessoas que têm biografia, história e respeitabilidade. Outras pessoas se surpreenderam ao nível que nós chegamos e reagem porque não querem concordar com a continuidade desse processo”, diz o professor da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria.

Desde que o presidente procurou usar a morte de Fernando Santa Cruz, desaparecido político na ditadura civil-militar, para atacar o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, filho do militante, além de desqualificar o trabalho da Comissão da Verdade, que apurou os crimes cometidos pelo Estado, diversos segmentos vieram a público repudiar as falas de Bolsonaro. O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que durante o processo eleitoral apoiou a eleição do candidato da extrema-direita, considerou “inaceitável” a afirmação. Um dos autores do pedido de impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, o jurista Miguel Reale Júnior, além de admitir que o golpe não tirou o país da crise, disse ainda que Bolsonaro “vive um processo alucinatório” e coloca a democracia brasileira em risco. Mesmo o Movimento Brasil Livre (MBL) tem procurado se distanciar do presidente.

Para Moreira, há um certo oportunismo. “No momento que foi oportuno a essas forças depor a presidenta que tinha sido eleita por voto popular, num processo sem crime de responsabilidade ocorrido, então se fechou os olhos para algumas declarações, atitudes”, avalia o jurista, em relação à coleção de polêmicas de Bolsonaro – que, ainda deputado, na votação do impeachment de Dilma, em 2016, homenageou o militar reconhecido como o maior torturador da ditadura, Carlos Alberto Brilhante Ustra – e, já como chefe do Executivo, chegou a defender a comemoração do golpe de 1964. “Apesar disso, eu reputo como necessário o reconhecimento por forças que apoiaram esse processo de desmonte da nossa democracia, para perceber que deve haver um limite para isso”, destaca o professor.

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