Tom de ameaça

‘Esse senhor faz um desserviço à democracia’, diz jurista sobre general Villas Bôas

Assessor do Gabinete de Segurança Institucional de Bolsonaro volta a fazer declaração pressionando o STF em decisão sobre prisão após condenação em segunda instância

Marcelo Camargo/EBC
Marcelo Camargo/EBC
Às vésperas do julgamento do HC de Lula, em 2018, general também usou do Twitter para incitar desordem para o caso que a liberdade do ex-presidente fosse concedida

São Paulo – O assessor especial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e ex-comandante do Exército, general Villas Bôas, presta “um desserviço à democracia” ao tentar intimidar os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) que começam a julgar, nesta quinta-feira (17), as Ações de Declaração de Constitucionalidade (ADCs) que contestam a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. A avaliação é do advogado criminalista José Carlos Portella Júnior.

Às vésperas da discussão na Corte, o general veio a público, pelo Twitter, depois de quase um mês ausente da rede social, para defender o que considera ser “instrumentos” usados para combater a corrupção e a impunidade. “É preciso manter a energia que nos move em direção à paz social, sob pena de que o povo brasileiro venha a cair outra vez no desalento e na eventual convulsão social”, afirmou.  Parte dos holofotes colocados sobre o julgamento das ADCs leva em conta uma eventual decisão que possa beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Em 2018,  às vésperas do julgamento do pedido de habeas corpus de Lula, o general Villas Bôas também se manifestou em tom da ameaça, citando a “convulsão social” que uma eventual liberdade do ex-presidente causaria no país. Em entrevista aos jornalistas Marilu Cabañas e Glauco Faria, da Rádio Brasil Atual, Portella, que é também professor de Processo Penal do Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba) e membro do coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia, avalia que o militar ainda é de certa forma refém do “autoritarismo” que marcou a ditadura civil-militar e que volta a ascender no governo de Jair Bolsonaro.

“A postura dele envergonha ou deveria envergonhar, no mínimo, qualquer pessoa civilizada que realmente preza pelos valores democráticos. Envergonhar o Estado brasileiro perante à comunidade internacional por admitir que um general fale coisas como essa, contra a democracia, que afetam o coração da Constituição, é ela que lega o direito à presunção de inocência. Diante da história que nós passamos no Brasil, de ditadura militar e regimes autoritários, mostrou-se essa garantia básica de presunção de inocência para que não fiquemos reféns de maiorias eventuais”, contesta a advogado criminalista.

As investidas da política sobre questões jurídicas também foram destacadas por Portella para analisar o encontro sigiloso, tratado como uma visita de cortesia, envolvendo o presidente Bolsonaro, o presidente do STF Dias Toffoli e o ministro da Corte Gilmar Mendes nesta quarta-feira (16), um dia antes, também, do julgamento das ADCs. “A gente fala, obviamente brincando, que foi uma baita coincidência, mas nós sabemos que na política as coisas não acontecem por acaso. Essa conversa ao pé do ouvido do presidente com ministros do Supremo é aquilo que revela que a Lava Jato tem uma base mais política do que jurídica”, ressalta o advogado criminalista.

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