Cultura nefasta

Maioria do STF decide que inquérito que apura ‘fake news’ é válido

Ao votar, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que a liberdade de expressão – invocada por extremistas bolsonaristas – não se confunde com ameaça, coação e atentado

Nelson Jr./SCO/STF
Nelson Jr./SCO/STF
O ministro Dias Toffoli chega ao plenário para dirigir sessão virtual que decidiu pela validade do inquérito que pode complicar situação de Bolsonaro no cargo

São Paulo – O Supremo Tribunal Federal formou maioria a favor da validade do inquérito das fake news, ao retomar o julgamento, suspenso na semana passada. A votação está 8 a 0 pela continuidade do inquérito, com posicionamento dos ministros Edson Fachin (relator da ação ajuizada pela Rede contra o inquérito), Alexandre de Moraes (relator do inquérito), Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.

O julgamento foi suspenso e deve ser retomado na próxima quarta-feira (24). Faltam votar os ministros Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli, presidente do STF. Mesmo com maioria formada, nenhum julgamento de plenário pode ser considerado definitivo antes do resultado final ser proclamado, mas dificilmente uma maioria formada é revertida, o que exigiria uma reviravolta e mudança de votos improváveis e raras.

Ao votar, pela manhã, Alexandre de Moraes afirmou que a liberdade de expressão não se confunde com ameaça, coação e atentado. A liberdade de expressão tem sido invocada pelos bolsonaristas de extrema direita para justificar os ataques ao STF e ministros.

Ameaças

Moraes citou mensagens enviadas por “militantes” contra a Suprema Corte. “Que estuprem e matem as filhas dos ordinários ministros do Supremo” foi uma delas. “Em nenhum lugar do mundo isso é liberdade de expressão. Isso é bandidagem. Isso é criminalidade”, disse em seu voto.

“Quanto custa atirar a queima roupa nas costas de cada ministro filha da puta do STF que queira acabar com prisão em segunda instância? Se acabarem com prisão em segunda instância só nos resta jogar combustível e tocar fogo no plenário com ministros barbies dentro”, continuou o relator do inquérito, mencionando outra ameaça.

A “coordenadora” do grupo neofascista “300 do Brasil”, Sara Winter, presa na segunda-feira (15), chegou a fazer ameaças diretas a Moraes. “A gente vai descobrir os lugares que o senhor frequenta, quem são as empregadas domésticas que trabalham para o senhor. A gente vai descobrir tudo da sua vida, até o senhor pedir para sair”, disse, entre outras ameaças.

Instituições

Gilmar Mendes também mencionou as “graves ameaças à vida de ministros do Supremo e seus familiares”, especialmente o próprio Moraes. Segundo Gillmar, citando doutrina norte-americana, fake news provocam forte impacto sobre as instituições republicanas dos Estados Unidos. Ele citou uma “cultura nefasta” os ataques ao tribunal incentivado por fake news.

A tensão entre o governo Jair Bolsonaro e o STF tem subido a cada semana, e, desde segunda-feira, atingiu seu ponto máximo. Depois da prisão de Sara Winter, no dia seguinte foram executados, pela PF, 21 mandados de busca e apreensão contra aliados do presidente Jair Bolsonaro, por determinação de Alexandre de Moraes.

Na mesma terça, foi divulgado que Moraes mandou quebrar sigilos fiscais e bancários de 10 deputados e um senador apoiadores de Bolsonaro. Bolsonaro reagiu à quebra de sigilo dos aliados, mais uma vez, com seu linguajar característico, com ameaças veladas ou diretas.

“Em 1970, eu já estava na luta armada e conheço tudo o que está acontecendo no Brasil”, disse. “Eu não vou ser o primeiro a chutar o pau da barraca. Eles estão abusando. Isso está a olhos vistos. O ocorrido no dia de ontem, no dia de hoje, quebrando sigilo de parlamentares, não tem história nenhuma visto numa democracia por mais frágil que ela seja. Então, está chegando a hora de tudo ser colocado no devido lugar”, ameaçou o chefe do Executivo.

Na opinião do cientista político Roberto Amaral, a grande preocupação do bolsonarismo são as apurações em torno das fake news. Isso porque são objeto não só do inquérito no STF como também de uma CPMI no Congresso Nacional.


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