Transparência

CPI da Lava Jato serviria para coibir abusos cometidos, defende jurista

Advogados, juristas e parlamentares querem que o Congresso investigue os “documentos encobertos” mantidos pelos procuradores de Curitiba

Fernando Frazão/ABr
Fernando Frazão/ABr
Além dos abusos cometidos na aplicação da lei, Lava Jato rendeu mordomias a procuradores e juízes

São Paulo – Após a revelação do procurador-geral da República, Augusto Aras, de que a Operação Lava Jato, em Curitiba, mantém milhares de “documentos encobertos”, inacessíveis até mesmo à Corregedoria do Ministério Público Federal (MPF), cresce a pressão para que seja instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os “abusos em série” cometidos pelos procuradores.

A criação de uma CPI é defendida por advogados do grupo Prerrogativas. Foi numa transmissão virtual do grupo que Aras revelou que a Lava Jato possui uma espécie de “caixa de segredos“, contendo dados de 38 mil pessoas. A instalação da comissão foi solicitada pelo líder do PDT na Câmara, deputado André Figueiredo (CE), e tem o apoio da bancada do PT.

Para o professor Rogério Dultra dos Santos, da Universidade Federal Fluminense (UFF), e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), a CPI seria um instrumento de investigação adequado para coibir os abusos cometidos pelos procuradores, desde 2014, quando a força-tarefa da Lava Jato foi instalada.

Ele defende a atuação dos parlamentares, na medida em que órgãos de controle, como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Conselho Nacional do Ministério Público e, até mesmo, o Supremo Tribunal Federal (STF), não foram capazes de fazerem os procuradores atuarem dentro da lei.

Desvios

Além da coleta ilegal de dados, a Lava Jato se notabilizou principalmente pelo abuso das prisões preventivas e pelo uso político das delações premiadas.

A atuação política ficou explícita com a perseguição ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que culminou com a sua prisão e o impediu de concorrer nas eleições de 2018. Ao mesmo tempo, o então juiz Sergio Moro negociava a sua ida para o governo do então candidato Jair Bolsonaro ainda antes do segundo turno, de acordo com o relatado pelo ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno.

Dultra destaca que o Ministério Público tem a função constitucional de zelar pela preservação da ordem legal. “E não utilizá-la como instrumento de vingança social e perseguição das classes populares e da esquerda, como tem sido até então”, afirmou, em entrevista a Glauco Faria no Jornal Brasil Atual, nesta quinta-feira (30).

“Acredito que uma CPI tenha condição de dar um recado público. São representantes do povo brasileiro que diriam que não serão tolerados abusos e a utilização da lei para a perseguição política”, afirmou o jurista.

Lista tríplice

Dultra rebateu as críticas que dizem que Aras não teria legitimidade para interferir na Lava Jato, pois foi escolhido fora da lista tríplice. Ele lembrou que essa “tradição”, instituída durante os governos do PT, não está prevista na Constituição. Além disso, tal método de escolha teria consequências negativas para o funcionamento do próprio Ministério Público, segundo o professor. Além de reforçar o corporativismo, as disputas eleitorais em torno da formação da lista tríplice acabam desviando os procuradores das suas atribuições.

“Os procuradores estão defendendo um processo que é prejudicial à própria legitimidade da instituição, que é essa escolha eleitoreira da lista tríplice. Acredito que esse é um momento passado. Nenhum presidente que virá vai correr o risco de ficar refém de uma instituição tão poderosa como o MPF”, disse Dultra. Ainda que a escolha de Aras pelo presidente Jair Bolsonaro tenha se dado por motivações “pouco republicanas”, a escolha fora da lista garantiu a independência necessária para confrontar os interesses dos próprios procuradores.

Assista à entrevista:


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