Polarização

Nas eleições municipais, Bolsonaro ‘mais repele votos do que atrai’

Pandemia deve nacionalizar e polarizar a disputa pelas prefeituras. Bloco “antibolsonarista” deve largar na frente, segundo Cláudio Couto (FGV-SP)

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A defesa enfática da cloroquina por Bolsonaro lembra a atuação de um garoto-propaganda

São Paulo – Apesar de conservar o apoio de cerca de um terço do eleitorado – os bolsonaristas mais fanáticos – o presidente Jair Bolsonaro registra os piores índices de aprovação, em primeiro mandato, desde a redemocratização. A omissão do governo federal no combate à pandemia e os escândalos de corrupção envolvendo a família presidencial podem afastar a maioria dos candidatos nas eleições municipais.

Ainda assim, esta deverá ser mais uma disputa polarizada e “nacionalizada”, de acordo com o cientista político Cláudio Couto, professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP).

Ele prevê a conformação de um bloco “bolsonarista” e outro, mais amplo, “antibolsonarista”. Este último deverá incluir desde candidatos do centro e da direita moderada, que buscam se afastar do presidente, até candidaturas de esquerda. O PT , segundo ele, continua sendo “um divisor de águas”.

“Creio que o PT ainda seja um dos divisores de águas da política brasileira. Justamente com o bolsonarismo, do outro lado, só que bem mais extremo. O PT não é um partido extremista. O bolsonarismo é um movimento extremista de direita”, disse Couto. “Temos uma polarização assimétrica, entre um lado que é extremista e outro lado que não é. O fato é que essa tende a ser a polarização. Os ânimos estão tão exacerbados, tão acirrados, no plano nacional, que é muito difícil que a gente não volte a ter, em 2020, uma eleição influenciada pelo clima político nacional.”

Risco

Nesse sentido, o cientista político aposta que “quem se associar ao Bolsonaro, corre o risco de incorrer no desgaste do governo”. O oposto também é válido. “Quem se apresentar como opositor a ele, corre o risco de ter mais sucesso.” Para ele, haverá espaço ainda menor para candidatos que não se posicionem “muito claramente” como apoiadores ou opositores do presidente.

“Acredito que Bolsonaro vai ser mais um peso do que um apoio. É claro que para os segmentos eleitorais muito ainda identificados com o bolsonarismo, se o presidente mandar todo mundo pular do precipício, o pessoal pula. Se falar que um candidato é apoiado por ele, pode ser que consiga votos nesse segmento do eleitorado. Mas creio que ele mais repele votos do que atrai”, afirmou.

Presidente sem partido

Além da perda de apoio popular, outra questão que terá consequências negativas para o governo é o fato de Bolsonaro não contar com um partido para chamar de seu. Depois de romper com o PSL, vem fracassando a tentativa de criação do Aliança pelo Brasil.

O cientista político lembra que o PSDB e o PT tiveram resultados expressivos nas eleições municipais que se seguiram às vitórias presidenciais. Prefeitos e vereadores são importantes cabos eleitorais para garantir a eleição de deputados estaduais e federais.

Sem partido, Bolsonaro não deve contar com esse fator para buscar ampliar a bancada de apoio ao seu governo nas próximas eleições presidenciais. Mesmo que consiga se reeleger, o presidente contaria com bases ainda mais frágeis no Legislativo, num eventual segundo mandato.

Vacina contra a antipolítica

Couto também acredita que a pandemia revelou a falta de capacidade administrativa de figuras, como Bolsonaro, que ascenderam na onda da antipolítica. “Entendo que se abre certo espaço para candidatos que sejam percebidos como mais dentro da normalidade. Por conta, justamente, desse caos produzido por ele e por alguns dos governadores que o apoiavam, como o do Rio de Janeiro, e de como eles têm conduzido a crise. Talvez uma parcela importante do eleitorado agora resolva regressar ao porto seguro dos políticos experientes e dos partidos tradicionais”.

Ele também confia que a disseminação de fake news deve ter papel menos relevante nas eleições municipais desse ano, na comparação com a disputa presidencial anterior. Por outro lado, as restrições de isolamento impostas pela pandemia devem reforçar ainda mais a importância das ferramentas eletrônicas nas campanhas.

“É claro que as fake news são um perigo inerente ao uso dessas ferramentas. Mas creio que as pessoas estão um pouco mais vacinadas com relação à maneira como as informações circulam no meio virtual, inclusive no Whatsapp. Quando digo que estão vacinadas, não é uma cobertura vacinal completa. Nem todo mundo está vacinado. Mas as pessoas estão um pouco mais cautelosas.”

Contudo, é mais difícil captar e combater as notícias falsas que circulam em nível local, já que o papel da imprensa profissional é mais precário fora das grandes capitais. Outro contraponto à disseminação das fake news são as agências de checagem, que também terão mais dificuldade em atuar na esfera municipal.


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