pós reeleição

No Paraná, Beto Richa surpreende com ‘tarifaço’ no fim do ano

Oposição acusa governador tucano de esconder verdadeira situação dos cofres públicos durante campanha eleitoral. De um pacote de 20 medidas, destaque para aumento do IPVA e do imposto sobre a gasolina

CC/ Wikimedia / RIT

Aumentos propostos por Richa impactam sobretudo os transportes, por conta de maiores IPVA e imposto sobre gasolina

Curitiba – Pega de surpresa por um “pacote de austeridade”, composto por um total de 20 medidas – apresentado ontem (2) pelo governo do Paraná, a oposição ao governador reeleito Beto Richa (PSDB) conseguiu hoje pedir vistas das propostas, o que deve retardar por alguns dias o trâmite do “tarifaço”. Com o pedido, interposto pelos representantes do PT na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Paraná, Tadeu Veneri e Péricles de Mello, 16 das medidas propostas por Richa ficarão paradas pelo menos até segunda-feira (8). No entanto, apesar da manobra da oposição e de os próprios deputados de situação qualificarem as propostas do governo como “amargas” e “impopulares”, é improvável que o legislativo estadual, de maioria governista, rejeite a iniciativa do Executivo.

O pacote proposto pela gestão Richa atinge principalmente os proprietários de automóveis. O IPVA subirá de 2,5% para 3,5% do valor do veículo, um aumento de 40%. A elevação fará com que o Paraná deixe de ter um dos IPVA mais baixos do país e salte para a terceira posição entre os mais elevados, atrás apenas de São Paulo e Minas Gerais. Ao mesmo tempo, o desconto para quem pagar esse imposto à vista cairá de 10% para 3%. Outra proposta prevê a elevação em um ponto porcentual do ICMS sobre a gasolina, de 28% para 29%. A medida deve levar ao aumento do preço do combustível nas bombas.

Outra parte da conta será paga pelos aposentados e pensionistas. A proposta sobre o tema prevê que os funcionários públicos aposentados e as pessoas que recebem pensão do governo estadual com vencimentos mensais superiores a R$ 4.390,24, teto do INSS, passarão a pagar 11% de imposto sobre o valor excedente.

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O governador Beto Richa: tarifaço levanta suspeitas de desequilíbrio das contas públicas

Enquanto isso, ao passo que as secretariais estaduais de Trabalho, Assuntos Comunitários e Indústria e Comércio serão extintas ou incorporadas por outras pastas, a responsabilidade sobre a administração penitenciária será retirada da Secretaria de Justiça e Cidadania e transferida para a de Segurança Pública.

O governo estadual também pediu a autorização da Assembleia Legislativa para pleitear empréstimo de US$ 300 milhões junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para obras de infraestrutura. Outras medidas propostas pelo governo incluem um corte drástico no orçamento da defensoria pública (R$ 90 milhões) e autonomia para que o governo estadual remaneje livremente 15% do orçamento.

O objetivo das medidas, segundo o governador, é chegar a um saldo positivo de até R$ 1,5 bilhão nas contas públicas. O pacote proposto por Richa dois meses depois de reeleger-se em primeiro turno “pegou a todos de surpresa”, afirmou o deputado oposicionista Tadeu Veneri (PT).

O petista ressalva, porém, que a oposição já imaginava que o governo precisaria tomar alguma atitude para aumentar sua arrecadação, “mas não com essa incoerência”, conforme declarou durante entrevista à Rede Brasil Atual.

O parlamentar acusou o governo de ter ocultado a real situação dos cofres paranaenses durante a campanha eleitoral, propagandeando um cenário de “fantasia”. Ao citar gastos em publicidade da ordem de R$ 600 milhões nos últimos quatro anos por parte do Executivo estadual, Veneri sustenta que o governo “gasta muito e gasta mal”.

“O governo extingue secretarias com o argumento de economia, mas incorpora todos os cargos, com exceção dos secretários e seus chefes de gabinete, em secretarias para as quais parcelas dessas atribuições estão sendo transferidas”, observou ele.

“O que o governo faz, me parece, é um movimento de duas ordens. Uma é muito mais de propaganda, com o discurso do rigor e da necessidade de enxugar a máquina pública e de fazer o que o governo chama de choque de austeridade – que não tem absolutamente nada de austero, pois vai haver uma economia mensal de pouco mais de R$ 100 mil, uma quantia absolutamente irrisória se você pensar que está fazendo toda essa movimentação para reduzir dois secretários e alguns outros cargos.”

“Segundo, há um aumento brutal nas alíquotas do IPVA, o que impacta praticamente 100% da população. O Paraná é o estado que tem hoje, proporcionalmente à população, a segunda maior frota automotiva do país. Praticamente todas as pessoas têm carro, ou todas as famílias têm um, dois ou três carros. Então isso vai impactar todas as pessoas indistintamente”, argumenta.

Apesar de a oposição ter antecipado a necessidade de aumento de arrecadação pelo governo, o pacote de austeridade causou surpresa tanto pela sua extensão quanto pelo fato de, até o início do ano, as contas estaduais estarem em ordem.

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Deputado Tadeu Veneri (PT): medidas em intensidade muito acima da esperada

Na opinião de Veneri, a situação crítica dos cofres paranaenses tem relação direta com as eleições de outubro. “O governo se comprometeu demais durante o período eleitoral e hoje não sabemos quais compromisso assumiu, com quem assumiu, por que assumiu e quando assumiu. A verdade é que o governo está fazendo apenas uma dança das cadeiras, uma fantasia nas suas contas”, afirmou o deputado à RBA.

Veneri acredita ainda que, ao invés de reduzir gastos, o governo corre o risco de ver não só um aumento de suas despesas como também diminuída a arrecadação. “Penso que isso pode gerar o efeito contrário ao que o governo espera, porque uma grande quantidade da frota emplacada hoje no Paraná – porque nós temos um valor bastante competitivo em termos de IPVA –, poderá ser feita em outros estados. Se isso acontecer, vai ser uma medida que causa efeito contrário”, exemplificou.

O governo também não informa exatamente de quanto é o rombo nos cofres públicos. Com isso, salientou Veneri, ninguém sabe se os valores propostos de cortes de gastos e aumento de arrecadação estipulados no pacote são suficientes. De acordo com o governo, os compromissos de curto prazo do estado do Paraná são da ordem de R$ 1,5 bilhão, sem contar dívidas de médio e longo prazo.

“O governador faltou com a verdade com seus eleitores”, acusou Veneri. “Acho que faltou ao governador Richa a franqueza e a lealdade que se precisa ter no processo eleitoral. O governador em nenhum momento mostrou que havia essa dificuldade e que seria necessário tomar essas medidas. Traçou [durante a campanha] um projeto e um cenário extremamente favoráveis, contrários a essa realidade”, lembra.

O discurso do próprio líder do governo na Assembleia apontou para uma direção parecida do raciocínio de Veneri, ainda que num tom mais ameno. “O eleitor pode se frustrar, se sentir traído. Mas nós temos de assumir a responsabilidade pelos nossos atos”, declarou Traiano.

Fazendo coro com seu governador, o deputado Ademar Traiano (PSDB), líder da bancada situacionista na Assembleia, defendeu na terça-feira que “a única saída” do governo “é fazer uma contenção terrível de despesas e aumentar a arrecadação”.