Passo em falso

Centrais Centrais reclamam e pedem manutenção da política de aumentos reais para o salário mínimo. Temporada de reivindicações começou

No início do ano, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, chegou a declarar que o governo barraria qualquer proposta de reajuste do salário mínimo que superasse o valor de R$ 540. O Dieese alertou que o aumento ficava aquém da variação da inflação (INPC) em 2010. Os R$ 540 representariam 5,88% de reajuste, enquanto o INPC fechou o ano com alta de 6,47%. Ou seja, significaria uma interrupção na política de aumentos reais estabelecida na gestão Lula. Com isso, as centrais deram os primeiros sinais de impaciência com os vaivéns do governo.

“É frustrante acompanhar o ressurgimento da tese de que os salários deterioram as contas públicas, especialmente porque esse ideário não fez parte do programa com o qual a presidenta Dilma foi eleita”, disse o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Wagner Gomes. Já o presidente da CUT, Artur Henrique, viu no impasse uma tentativa de impor ao país uma “agenda dos derrotados” na eleição.

Pelos critérios negociados, a política permanente de reajuste inclui o INPC do ano anterior mais a variação do PIB de dois anos antes. Ou seja, o reajuste do atual mínimo teria de levar em conta a inflação de 2010 e o PIB de 2009 – que no entanto não cresceu, foi negativo (-0,6%).

Passadas as esperadas reclamações, o mesmo Mantega anunciou que o mínimo iria para R$ 545 a partir de 1º de fevereiro. Um aumento real mínimo. As centrais, que reivindicam R$ 580, reclamaram novamente, e em 18 de janeiro reuniram algumas centenas de pessoas em protesto na Avenida Paulista, em São Paulo. A pauta discutida com o governo inclui a correção da tabela do Imposto de Renda. Os sindicalistas argumentam que, sem isso, parte dos reajustes salariais seria perdida.

Em 26 de janeiro, os sindicalistas foram recebidos pelo secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho. As negociações continuariam em fevereiro e caminhavam para um acordo, talvez distante do que esperavam as centrais. Dois dias depois do encontro, a presidenta Dilma Rousseff endureceu: “O que queremos saber é se as centrais querem ou não a manutenção do acordo. Se querem, o que nós propomos para este ano é R$ 545”.

O governo argumenta que não está descumprindo o acordo e acena com um reajuste mais polpudo em 2012. Como as projeções para o crescimento do PIB de 2010 estão em torno de 7,5% e se espera uma inflação perto de 5,5%, o mínimo poderia atingir R$ 618 no ano que vem, tendo como base os R$ 545. Com o costumeiro arrendondamento, ficaria em R$ 620, o que representaria reajuste de 13,76% – aumento real de 7,83%. Mas como fica o aqui e agora?

O mínimo abre a temporada de reivindicações de 2011. A expectativa é que, agora, outras discussões vinguem, como a da reforma tributária.

“O tema já foi bastante debatido no segundo mandato do governo Lula. Hoje, há um consenso a respeito de sua necessidade e até mesmo de sua urgência, mas não sobre seu conteúdo”, afirma o diretor do Departamento Intersindical de Assessoria­ Parlamentar (Diap) Antônio Augusto de Queiroz. Ele observa que a disputa entre “o contribuinte e o governo” se dá em três níveis do Executivo (federal, estaduais e municipais), “cada um querendo aumentar sua parte da receita”.

Mesmo assim, Queiroz vê mais condições de acordo – devido, entre outros fatores, à presença de uma oposição “menos virulenta” e com governadores mais dispostos ao diálogo.