Crônica

A bancada da marvada

A depender dos resultados das eleições de 2010, Minas Gerais pode iniciar uma nova frente parlamentar no Congresso: a dos cachaceiros

mendonça

Ninguém está chamando os ilustríssimos postulantes ao Parlamento nacional de beberrões nem de irmãos-da-opa. Ocorre que o governador Aécio Neves (PSDB), de Minas Gerais, e o vice-presidente José Alencar (PRB), ambos cotados para concorrer ao Senado, não têm como negar a alcunha, como explica qualquer alambiqueiro. O termo ”cachaceiro“ aplica-se, neste caso, aos produtores da marvada. Nome também cotado, o ex-presidente e ex-governador Itamar Franco tem outros elos com a malafa.

Aécio e Alencar criaram marcas próprias da molha-goela. A Mingote é apenas o rótulo mais recente da Fazenda da Mata, na cidade de Cláudio. Trata-se de uma homenagem a Domingos da Silva Guimarães, tetravô do governador de Minas, cujo retrato está no rótulo. Seu apelido era Mingote e foi ele quem reativou a atividade alambiqueira na propriedade. Consta que Aécio tem sociedade no empreendimento, fruto da união entre a família Guimarães Tolentino e a dinastia dos Neves em virtude do casamento entre dona Risoleta, pela primeira, e Tancredo, pela segunda.

Até 1985, o carro-chefe era a chambirra que respondia pelo nome de Mathusalem. Se o personagem bíblico chegou a 969 primaveras, a branquinha homônima foi descontinuada depois do falecimento de Tancredo. Outras marcas de menor qualidade também são produzidas, mas sobre essas o governador nega qualquer ingerência.

Já Alencar se encarrega da Maria da Cruz, produzida na Fazenda Cantagalo, em Pedras de Maria da Cruz. A proximidade da região de Salinas, no norte do estado, favorece. A propaganda boca a boca é feita pelo próprio empresário – até com garçons, segundo fontes. A propriedade ainda engarrafa outras três marcas – Sagarana, Caninha 38 e Porto Estrela. Assim como há diferenças políticas entre esses mineiros, as divergências também aparecem na forma de envelhecer aquela-que-matou-o-guarda. A de Aécio descansa de cinco a dez anos em amendoim. A do vice-presidente, em amburana, madeira típica do semiárido brasileiro.

Não é à toa que Aécio ampliou a certificação de alambiques artesanais e incluiu a rapadura na merenda escolar da criançada. Mas é bem verdade que quem tornou a caninha bebida oficial do estado foi seu antecessor, Itamar Franco, que estuda concorrer igualmente ao Senado. Se tirar uma das vagas dos cachaceiros citados, também será bem-vindo à bancada da cachaça, além de instituir o 21 de maio como data comemorativa para a mata-velho.

A composição da bancada da cachaça – ou dos cachaceiros – depende da formação das chapas, dos resultados das urnas e, claro, da disposição das figuras de abraçar a causa. Consta uma experiência sem grande repercussão na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Muito diferente da bancada da cana-de-açúcar e do setor sucroalcooleiro.

Os mineiros envolvidos na política valorizam as golos há algum tempo. O porta-voz de João Figueiredo e ex-ministro do Tribunal de Contas da União, Carlos Átila, abriu, depois da aposentadoria, seu alambique próprio. A Cachaça do Ministro dorme por cinco anos em carvalho ou jequitibá, a depender do rótulo – ouro e prata.

Entre empresários, o baiano Emílio Odebrecht, da empreiteira que leva seu nome, e o paulista Ivan Zurita, presidente da Nestlé, também debruçam sobre uma boa pinga. São donos da Itagibá e da Do Barão, respectivamente.  

Anselmo Massad é jornalista da Rede Brasil Atual e um dos criadores do site Futepoca – Futebol, Política e Cachaça www.futepoca.com.br