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Embu, pólo de artes e de idéias

Fundada no século 16, a antiga aldeia M’Boy tem hoje a maior concentração de artesãos do país e busca auxílio para se tornar marca forte no turismo brasileiro e estrangeiro

paulo pepe

Ainda se respira pela cidade, charmosa por sua feira de artesanato, suas vielas, ateliês e antiquários, os ares que sopravam no século 16, quando ela nasceu como aldeia M’Boy, cobra grande em tupi-guarani. A chegada dos jesuítas espanhóis da Companhia de Jesus garantiu a preservação dessa atmosfera histórica à cidade: foram eles que, sobre terras cedidas por Fernão Dias e Catarina Camacho, construíram na segunda metade do século 17 uma igreja e um convento, no Centro Histórico da Estância Turística de Embu das Artes.

Completamente preservado, o conjunto jesuítico inclui a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, sede do Museu de Arte Sacra – o principal atrativo histórico da cidade –, proporciona uma viagem rumo a quatro séculos atrás, com seu estilo barroco e seu acervo rico em imagens de santos, anjos e personagens bíblicos. As peças, entalhadas em madeira, modeladas em terracota ou em armações de roca, foram em boa parte produzidas pelos jesuítas com a ajuda dos próprios índios guaranis catequizados, que utilizavam cabelo humano em seu acabamento. Os passos se dão sobre o piso original, sustentado por paredes de taipa com cerca de 60 centímetros de largura. Como uma cereja sobre o chantili, lá está exposto o mais antigo órgão do Brasil.

Mas Embu – na Grande São Paulo, cerca de 30 quilômetros ao sul da capital pela Rodovia Régis Bittencourt – não é somente história e muito menos apenas um pólo moveleiro. A cidade abriga a mais famosa feira de artesanato do país – inaugurada oficialmente em 1969 –, que ocorre, ininterruptamente, o ano inteiro. A cada domingo, das 10 às 18 horas, os artesãos recebem 20 mil visitantes. A feira também acontece aos sábados, mas com apenas metade dos 700 expositores dominicais. E cresce a cada ano: nos últimos 12 meses, foram incorporados 80 novos artesãos. Destes, apenas três são de fora do Embu; dos demais, 80% são artistas provenientes da periferia da cidade.

A prefeitura aposta que a vocação artística da cidade pode inspirar, também, geração de emprego e renda. Até poucos anos atrás, Embu era conhecida como uma das mais violentas cidades brasileiras. Essa fama aos poucos foi se desfazendo com os esforços empreendidos, como o desenvolvimento de diversas ações na área de saúde, transporte e infra-estrutura e com a criação de cooperativas das mais diversas atividades, da costura ao artesanato.

Em 2002 foi inaugurada no município a primeira Incubadora de Cooperativas do Estado de São Paulo, que já beneficiou mais de 450 famílias. Por essas e outras iniciativas, o prefeito Geraldo Leite venceu a etapa nacional do Prêmio Sebrae de Prefeito Empreendedor de 2005. E quer ir mais longe, para o que trava uma verdadeira batalha para sensibilizar a iniciativa privada a participar do esforço. “Os recursos públicos estão indo para onde devem ir, criando melhor infra-estrutura para a população carente. Por essa razão, precisamos de apoio privado para fazer de Embu uma marca, como Campos de Jordão ou Barretos. Precisamos trazer para cá redes de hotéis, pousadas, restaurantes conhecidos, casas de câmbio, teatros, e até mesmo uma Faculdade de Artes. O público, 12 meses por ano, nós já temos: falta infra-estrutura para atendê-los melhor”, afirma o secretário de Turismo, Renato Gonda.

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Mistura cativante

O passeio por Embu das Artes oferece contato com uma incrível mistura de etnias, religiões e nacionalidades que encanta qualquer visitante. A cidade abriga uma grande comunidade japonesa e outra negra, além de ter recebido, nos anos 60 e 70, uma verdadeira horda de latino-americanos. Dividindo os mesmos 300 metros quadrados, é possível encontrar uma igreja batista, um centro de umbanda e a Capela de São Lázaro, igreja construída em 1934. Não bastasse essa característica, Embu das Artes faz jus ao nome.

Desde a década de 1920, com a chegada do pintor Cássio M’Boi – responsável por trazer ao local seus primeiros visitantes ilustres, como os artistas da Semana de 22 –, a cidade transpira arte, em todas as suas manifestações. Lentamente, outros grandes nomes foram se instalando na região, como Tadakiyo Sakai (escultor), Solano Trindade (poeta) e Abdias do Nascimento (fundador do Teatro Experimental do Negro), para citar somente alguns.

“Quando cheguei, em 1965, não havia quase nada em termos de infra-estrutura. Mas era aqui que eu encontrava pelas ruas os grandes representantes da arte nacional e acabei me integrando. Era uma espécie de burgo artístico. E, de repente, a cidade ficou grande”, descreve o pintor, escultor e desenhista mineiro Wanderley Ciuffi.

Lado a lado, é tecida uma verdadeira teia de artistas de alta qualidade: Agenov, com seus trabalhos em pedra-sabão, madeira e bronze; Bonfim, com sua arte naïf; Wenceslau Molina, mais conhecido como Gigio, chileno que cria instrumentos musicais a partir de coco, madeira, conchas e outros materiais desde 1977; e o argentino Miguel Angel Cabrera, que trabalha com bronze, cobre e pedras, cujas peças são exportadas para Alemanha e França. E segue-se uma longa lista de artistas de qualidade, que representam o que há de melhor no país.

Mesmo com tamanha representatividade, Embu não é feita apenas de arte. É uma cidade festeira, que promove feiras e eventos praticamente todos os fins de semana do ano. E também oferece espaços que por si só já valem a visita. O Museu do Índio, o Memorial Sakai, o Centro Cultural, suas diversas galerias de arte, ateliês e antiquários e o Parque do Lago Francisco Rizzo são alguns deles. O parque ocupa uma área de 217 mil metros quadrados e seu lago central está repleto de carpas e tainhas, patos e tartarugas marinhas. Ali a prefeitura mantém uma área permanentemente dedicada a eventos e oferece a facilidade de transporte gratuito aos turistas que estão no centro.

A natureza local também atrai os mais ligados ao ecoturismo, um segmento em que a prefeitura também pretende investir em breve. Não é para menos: 60% do município é composto de área ambientalmente protegida, pois é lá que se localiza grande parte dos mananciais do Guarapiranga. “Já viemos para Embu mais de 30 vezes”, conta o texano Robert Faricy, executivo da área de tecnologia residente em Alphaville (SP) há um ano e meio. Vem com a família em peso. “É uma cidade tranqüila, com muitas opções culturais e onde se come muito bem”, valoriza o americano.

Paulo Pepeigreja
A Igreja de Nossa Senhora do Rosário guarda a sede do Museu de Arte Sacra, com várias peças entalhadas pelos jesuítas e índios, além do órgão mais antigo do Brasil

Serviço
Centro de Atendimento
ao Turista: tel. (11) 4704-6565
www.embu.sp.gov.br

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