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O voto que decide

A forma como você decide seu voto tem a ver com o que você espera dos governantes e dos parlamentares. “Faça” você mesmo a sua cabeça e leve a sério essa escolha

jailton garcia

Vidal Nascimento, piloto de avião, São Paulo

Faltam poucos dias para a votação que escolherá presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais. Neste período uma enxurrada de informações sobre os candidatos e os partidos invade a vida dos eleitores. Em especial, nos horários de propaganda no rádio e na TV. Se alguns artifícios de campanha foram vetados pela nova lei – como o uso de cartazes, distribuição de camisetas e os famosos showmícios –, nos programas eleitorais a fórmula não mudou muito.

Aparentemente, essa repetição cansa o eleitorado. Menos da metade dos brasileiros e brasileiras aptos a votar assistiu aos programas dos candidatos à Presidência da República na TV na primeira semana de transmissão, segundo pesquisa do Datafolha. “Eu não me deixo levar pelos temas de campanha. Não vejo horário eleitoral. É tudo já tão batido”, comenta a estudante Jessicca Zuzzi.

O problema é que, num país-continente como o Brasil, a propaganda eleitoral pelo rádio e pela TV ainda é a forma que a imensa maioria da população tem de conhecer os candidatos. Não é o ideal. Para o diretor da organização não-governamental Transparência Brasil, Cláudio Weber Abramo, os meios de comunicação poderiam fornecer mais informações sobre os candidatos. “Tanto os grandes veículos de alcance nacional quanto os veículos locais, com informações sobre os candidatos locais. São informações públicas e relevantes para o eleitor”, afirma Abramo.

É preciso estar bastante atento para distinguir projetos de estratégias de marketing. Promessas “bem embaladas” já custaram caro em outras eleições. Obras não podem ser tratadas como espetáculo. Verificar o compromisso com programas já existentes e que dão certo também é importante. É comum as obras “espetaculares” acabarem em prejuízos para os cofres públicos. Por outro lado, a descontinuidade de serviços essenciais – só porque foi obra da “gestão anterior” – igualmente causa danos à população.

Além desses custos financeiros e sociais, promessas descumpridas ao longo dos anos alimentam o ceticismo em relação à política. A bancária Andréa Aniella, por exemplo, diz que vai procurar “o candidato que mentir menos”. Para o metalúrgico Nelson Brilhante do Sol Gayno, “na realidade, a maioria não está sendo sincera”.

Outro ponto a enfadar os eleitores é o bombardeio de acusações, a repetição constante de denúncias, sem que haja tempo ou mesmo argumentos suficientes para sustentá-las. Para a advogada Cleonice Inês Ferreira, a melhor maneira de fugir desse fogo cruzado e saber quem é o candidato de fato são os debates. “O horário eleitoral é meio massacrante, você tem de ouvir coisas péssimas”, comenta a advogada. “Vou acompanhar o horário eleitoral no rádio e TV, mas a decisão será principalmente pelo debate.”

Parte do eleitorado recorre ao artifício de determinar sua escolha pelo envolvimento do candidato com determinada área ou tema. Fica mais fácil acompanhar informações e medir o compromisso dos candidatos quando eles têm um campo específico de atuação. “Como sou militante GLBT (sigla de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros), o que pesa no meu voto – há mais de dez anos –, especialmente para o Legislativo, é o compromisso do candidato parlamentar com relação às demandas feministas e os direitos do segmento GLBT”, afirma Regina Facchini, vice-presidente da Associação da Parada do Orgulho GLBT de São Paulo.

As comunidades e associações ligadas às religiões de matriz africana até lançaram a campanha “Filho de axé vota em filho de axé”. “Estamos trabalhando para que o negro, respeitando seu passado e sua cultura, mesmo tendo outra religião, saiba avaliar a importância de representantes das religiões de matriz africana para combater preconceitos”, diz Egdomy Marisabel de Xangô, presidente da Comissão da Mulher da Associação Cultural, Religiosa e Beneficente Comunidade de Oyá e de Ogun.

Nas eleições majoritárias (para presidente e governador), a cobrança por compromissos monotemáticos pode fazer parte da escolha, mas o Poder Executivo exige abordagens mais amplas. A opção do secretário de relações internacionais da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong), Sérgio Haddad, é pelo compromisso político. “Construo meu voto olhando para aquele ou aquela que melhor condição tem de implementar direitos, com justiça social e com democracia, a partir das pressões sociais e junto com elas, e que tenha respaldo de uma aliança partidária progressista e estruturada que lhe dê governabilidade ao mandato”, diz.

Para Cláudio Weber Abramo, o exercício de traçar o perfil que “se gostaria de ver na Presidência ou em qualquer outro cargo” é um dos passos do processo de escolha. Mas o eleitor precisa levar em conta também se os programas têm a ver com suas aspirações. A Revista do Brasil foi às ruas perguntar a pessoas de diferentes perfis – ligadas ou não a alguma causa social – quais são suas expectativas para o próximo período no governo federal. A idéia é levar aos leitores a seguinte reflexão: o que você espera do próximo governo e como você constrói o seu voto nessa direção.

Fernando Rossetti, secretário-geral do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife)

Independentemente de quem for eleito, espero que implemente políticas de Estado, e não só deste ou daquele grupo partidário. Uma boa parte do atraso nas políticas públicas sociais brasileiras se deve à descontinuidade das propostas e projetos na área. Com essa perspectiva de estadista, o Brasil poderia começar a ter planejamento de longo prazo. Também espero que haja continuidade de boas políticas públicas sociais já implementadas.

Andréa Aniella, bancária, São Paulo

Minha expectativa é de que haja mais trabalho, uma reforma na saúde e nas escolas. É o básico, que a gente fica sempre esperando que aconteça no próximo governo. É preciso gerar mais empregos. Se eu sair do banco hoje, não tenho onde trabalhar. Para gerar mais empregos é preciso diminuir impostos, para o empresariado poder investir e contratar mais.

Regina Facchini, vice-pres. da Associação da Parada do Orgulho GLBT, São Paulo

Espero um governo preocupado com questões sociais. Que procure equilibrar necessidades econômicas do governo em relação às necessidades sociais – ou seja, política econômica é necessária, sim, mas não se pode fazer isso em prejuízo dos segmentos carentes ou vulneráveis da sociedade.

Juçara Zottis, militante de movimento pela democratização da comunicação, São Paulo

É importante a participação da sociedade de maneira mais democrática nas decisões, com a construção de um modelo social mais a cara do povo. Acho que o governo tem de investir mais em questões sociais – não só com políticas compensatórias, mas via o aquecimento da economia e de geração de empregos. Outros pontos cruciais são a reforma agrária, a demarcação das terras indígenas e a democratização dos meios de comunicação social.

Geraldo Silva Oliveira, operário da indústria química e poeta, São Paulo

Tomara que os projetos do governo atual tenham continuidade e que se procure avançar mais um pouco na parte da educação. Acredito que, investindo na realidade das culturas oprimidas, o governo terá um grande avanço. Queria que houvesse uma integração maior dos setores de educação e cultura. Maiores investimentos na cultura tirariam muita gente, com certeza, do mundo do crime e das drogas.

Jessicca Zuzzi, estudante, São Paulo

Gostaria de ver um plano de governo para a população de baixa renda mesmo, para reverter esse quadro social. Alguma coisa que dê para sentir não só por índices, por pesquisas, por notícias de que o país está desenvolvendo, mas também no cotidiano, na minha vida, na vida de quem está perto, na de quem está precisando.

Sandro Henrique da Silva, desempregado, São Paulo

Queria que o próximo presidente investisse bastante em emprego, para nós, analfabetos, termos uma chance de trabalhar para ganhar o pão de cada dia para os filhos. É preciso ajudar os moradores de rua, que estão aí jogados, largados, sem condições, sem que ninguém dê uma chance para eles, que estão como eu, sem tratamento, passando fome, comendo comida do lixo.

Regina Sena, professora e vice-diretora de escola, São Paulo

Espero que o novo governo consiga levar adiante os projetos sociais. E que, em São Paulo, melhorem principalmente a educação, a saúde e a segurança. Espero que tenha sempre um canal aberto entre governo e sociedade, para que os problemas sejam resolvidos com contribuição de todos. No estado, a educação tem sofrido e precisa melhorar. Na esfera federal, espero que haja continuidade da política responsável que está sendo aplicada tanto na área econômica quanto na social.

Sônia Coelho, diretora da Sempreviva Organização Feminina, São Paulo

Acho que o governo precisa mudar o modelo econômico de juros altos, que privilegia banqueiros e latifundiários. A prioridade deve ser o emprego, o trabalho e a distribuição de renda. O modelo atual mantém a concentração de renda – com isso é impossível haver mudança. Outro ponto é que a democracia representativa não dá conta de responder às necessidades da população. Minha expectativa é de que a maioria da população tome parte nas decisões que definem os rumos do país, com novos espaços de controle, participação e fiscalização.

Ísis Lima Soares, coordenadora do Projeto Cala Boca Já Morreu, São Paulo

Uma coisa que já era esperada, e continuo esperando que aconteça, é uma solução para a legislação sobre radiodifusão comunitária. A grande expectativa é de que seja implantada uma nova política que inverta a lógica reinante hoje. Uma política efetiva de comunicação comunitária dentro do Ministério das Comunicações é fundamental e muito esperada.

José André, técnico de segurança do trabalho aposentado, São Paulo

Espero que o próximo governo continue investindo nas áreas sociais. E que deixe a Polícia Federal continuar trabalhando como nunca, combatendo a corrupção, que antigamente existia, mas ninguém combatia e ninguém ficava sabendo.

Jorge Augusto Lourenço, fotógrafo, São Paulo

Espero do próximo governo o que todo mundo esperaria: que vá lutar contra essa violência que está acabando com o país. O Rio de Janeiro já estragava um pouco a imagem do Brasil. Agora São Paulo também está contribuindo para ela ficar pior. É preciso lutar contra isso – é uma das coisas que estão acabando com a gente.

Anilton de Souza, metalúrgico, São Bernardo

Espero políticas melhores para as populações mais pobres. Reconheço a importância deste governo nisso, mas tem de ir adiante.E a geração de emprego tem de continuar. O governo também precisa melhorar o sistema de previdência, que é uma coisa importante para o trabalhador. Vejo muita gente que já cumpriu muitos anos de serviço e não consegue se aposentar.  Não sei se precisa fazer uma reforma,  mas isso tem de ser melhorado.

Egdomy Marisabel de Xangô, da Associação Cultural Oyá e de Ogun, São Paulo

Espero que continue a limpeza no meio político, no sentido de acabar com a impunidade. Em segundo lugar, que as políticas públicas relacionadas ao negro e à mulher saiam um pouquinho do sonho e sejam algo mais concreto, abrangendo educação e saúde. Houve avanços em relação ao negro, mas a religião de matriz africana não tem o respeito necessário. No campo ambiental, espero que o governo proteja a Mata Atlântica e a Amazônia.

Cleonice Inês Ferreira, advogada, São Paulo

O básico para o próximo governo é investir mais na educação. Ia diminuir essa violência e até a corrupção. O que estamos vivendo hoje é o resultado da corrupção, entre os policiais, entre as pessoas do Judiciário. Mas a culpa maior é da própria sociedade, que é conivente com bandido.  Quero que o próximo governo invista em educação para todos mesmo: pobre, rico, sem diferença de classe, sem distinção.

Marina Santos, coordenação nacional do Movimento dos Sem Terra, Brasília

Espero que o próximo governo institua um novo modelo agrícola que priorize a agricultura camponesa e familiar, o mercado interno, o povo brasileiro. Para isso, é necessário que sejam assentadas as 150 mil famílias acampadas à beira das estradas e atualizados os índices de produtividade agrícola, além de ampliado o crédito para a agricultura familiar. O governo precisa mudar a política econômica em curso, para que sobrem recursos para resolver os problemas sociais do povo.

Nelson do Sol Brilhante, metalúrgico, Sorocaba

Investimento na área social, é o que espero, o que significa principalmente investir na educação. Eu tenho filhos e não vejo que esteja sendo investido em planejamento para os professores. O governo precisa investir no pessoal de base da escola, para evitar que ela vire espaço para o tráfico de drogas. Quem investe no jovem só vai colher coisas boas. E eu quero ver mais honestidade.

Sérgio Haddad, diretor de relações internacionais da Abong e coordenador-geral da Ação Educativa, São Paulo

Espero que haja crescimento econômico com desenvolvimento sustentável, no sentido socioambiental. O novo governo tem de agir em relação ao maior problema do país: distribuição de renda e riqueza. Além disso, precisamos de uma reforma política com o aprimoramento da democracia participativa e de melhorias no atendimento público da educação e da saúde.