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Na mineiríssima Serra da Canastra nasce o Velho Chico

Serra da Canastra, no sudoeste mineiro, é um lugarzim bem bom e fica logo ali

O sudoeste mineiro, é um lugarzim bem bom e fica logo ali
 <span>(João Marcos Rosa/Nitro)</span>Veado-campeiro <span>(João Marcos Rosa/Nitro)</span>Casca d’Anta <span>(João Marcos Rosa/Nitro)</span> <span></span>Tamanduá-bandeira <span>(João Marcos Rosa/Nitro)</span>Maturação de queijo canastra em Medeiros <span>(João Marcos Rosa/Nitro)</span>

Tranquilidade, contemplação e um sabor inigualável. Da estrada de terra que dá acesso ao Parque Nacional da Serra da Canastra, a partir da cidade de São Roque de Minas, já é possível desfrutar o majestoso cenário: o imenso baú rochoso que dá nome à serra e guarda verdadeiros tesouros naturais e da cultura do sudoeste de Minas Gerais. Adiante, o que se terá é uma saborosa sequência de descobertas – tanto das paisagens como da tradição da gente que mora nas redondezas da reserva.

Após a entrada, uma das primeiras paradas obrigatórias é a nascente histórica do Rio São Francisco. Mesmo que posteriormente se tenha constatado que a nascente geográfica está a alguns metros dali, vale conhecer e registrar o pequeno filete d’água próximo à imagem do santo homenageado. Foi justamente para proteger o berço do Velho Chico – que pouco a pouco ganha corpo e força para percorrer boa parte do país – que a região se tornou parque nacional, em 1972. Mas apenas 70 mil hectares dos 200 mil previstos no decreto de origem foram, de fato, indenizados e constituem a área real do parque, atualmente administrado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente.

Se à distância o que impressiona é o grande baú, mais de perto a serra acolhe como uma muralha a proteger a vida silvestre que habita a região. Ao sabor dos ventos que sopram em altitudes que variam entre 900 e quase 1.500 metros, o capim dourado camufla tamanduás-bandeira, emas, lobos-guará e veados-campeiros. Para flagrar alguns desses ilustres moradores é preciso olhar atento e muita paciência. Os carcarás parecem menos refratários a lentes fotográficas. Aproximam-se em voos rasantes, cruzam as estradas caminhando ou mesmo pousam – e posam – calmamente sobre placas e cupinzeiros.

Além da estrada que corta o parque de fora a fora, há os caminhos secundários e trilhas que levam às cachoeiras. Destas, algumas passam de 90 metros de altura, como a famosa Casca d’Anta, o principal cartão-postal, que devido à força das águas pode apenas ser contemplada à distância – tanto da parte baixa, pela estrada que liga os municípios de Vargem Bonita a São José do Barreiro, quanto pela parte alta, seguindo a estrada principal do parque, com todo o acesso sinalizado.

A melhor época para visitação é de abril a outubro, quando há menor incidência de chuvas. Já as temperaturas são bem amenas, com média de 19 graus no inverno e 23 no verão. E essa combinação especial de clima, relevo e altitude não só cria condições ideais para belos cenários como também ajuda a perpetuar uma tradição: a produção de queijos artesanais.

Nos sete municípios que circundam o parque, com seus pequenos distritos e lugarejos, vivem cerca de 1.500 produtores artesanais do queijo canastra. Os mais antigos acreditam que o clima do pé da serra faz toda a diferença para a qualidade do leite. E a tradição vem desde a época em que a Canastra era caminho de tropeiros. São famílias que há pelo menos quatro gerações se dedicam à produção do queijo produzido a partir do leite cru.

Levemente ácido, o queijo canastra é o ingrediente principal do delicioso pão de queijo mineiro e de outras iguarias, como o “joão-deitado”, feito à base de mandioca e queijo ralado e assado em folhas de bananeira. Encontrado em três principais pontos de maturação, o canastra pode ser consumido fresco (com até quatro dias), meia cura (entre cinco e 14 dias) ou curado (a partir de duas semanas) e é a combinação perfeita para as diversas compotas e outros doces que também dão fama à culinária de Minas Gerais.
Além de sabor e tradição, o queijo hoje coleciona certificações. Desde 2008 leva o título nacional de Patrimônio Cultural Imaterial e no ano passado, após o incentivo e o intercâmbio cultural com produtores franceses do queijo camembert, conquistou a Certificação de Identificação Geográfica pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) – o que delimita a região produtora e considera canastra apenas o queijo produzido a partir do mesmo processo nos municípios de Bambuí, Delfinópolis, Medeiros, Piumhi, São Roque de Minas, Tapiraí e Vargem Bonita.

A titulação de origem, ainda pouco utilizada no Brasil, já é realidade em muitos outros países para identificar produtos e processos específicos, como dos vinhos italianos, charutos cubanos e queijos de regiões da França, Holanda e Suíça. Agora, a mais recente conquista dos produtores da Serra da Canastra foi a instalação de um centro de maturação dos queijos, localizado no município de Medeiros. Com isso, além de valor e reputação especiais, o queijo tem ambiente adequado às regras sanitárias de embalagem e distribuição, sem perder no quesito tradição. Assim, o queijo canastra, em breve, poderá ser comercializado em todo o Brasil e até mesmo exportado. Mas, de todo modo, o melhor mesmo é conhecê-lo e saboreá-lo na sua origem, desfrutando o belo cenário e a boa prosa da gente da Canastra.

Para visitar

Uma distância de 320 quilômetros separa a capital mineira do local. Para chegar por avião, a opção é o aeroporto de Araxá, a 160 quilômetros do parque. Se a escolha for por terra, o trajeto é feito pela BR-381 sentido São Paulo, seguindo depois pela MG-050, que é pavimentada até São Roque de Minas. A partir daí, os poucos quilômetros restantes são em estrada de terra já na companhia da bela Canastra. Para os visitantes que partem de São Paulo ou do sul das Gerais, a opção é chegar por Passos, São Sebastião do Paraíso e então pegar o acesso à MG-050. Aberto para visitação das 8h às 18h, o parque nacional cobra uma taxa de entrada de R$ 13 – turistas brasileiros pagam metade do valor. Como em toda reserva ambiental, são observadas diversas regras. É proibido, por exemplo, o uso de equipamento coletivo de som e o transporte ou consumo de bebidas alcoólicas na área, o que ajuda a evitar confusão e acidentes nas proximidades das diversas cachoeiras. A presença de pedras e a erosão pelos caminhos sugerem o uso de veículos com tração nas quatro rodas.