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A história toda muda se mudar no começo

Documentário 'O Começo da Vida' trata da importância dos primeiros anos de vida das crianças para o futuro da humanidade

Divulgação

Cena do documentário. Crianças não são ajudadas por programas, mas por pessoas

A sociedade, em geral, tem cuidado bem dos primeiros anos de vida das pessoas? Esta é a questão central do documentário O Começo da Vida, que tem estreia prevista para 5 de maio nos cinemas brasileiros e exibições gratuitas pela plataforma on-line VideoCamp. Dirigido pela cineasta ­Estela Renner, o longa-metragem investiga vários temas ligados à primeira infância, a partir das recentes constatações científicas de que os bebês se desenvolvem a partir da combinação entre a sua carga genética e as relações com as pessoas que os rodeiam.

O filme poderia ser apenas um apanhado de depoimentos de especialistas gabaritados nesta área, mas o que Estela consegue é permear as entrevistas com estudiosos e profissionais de várias partes do mundo com o encantamento típico da infância. Ela visita famílias de diferentes culturas, etnias e classes sociais no Brasil, na Argentina, nos Estados Unidos, no Canadá, na Índia, China, Itália, França e no Quênia e trata sobre diferentes questões que dizem respeito ao começo da vida.

A diretora incita uma profunda reflexão sobre que futuro a sociedade quer. “O objetivo do filme, ou talvez o meu sonho, é em primeira instância trazer para o conhecimento de todos – e para o coração de todos também – a importância dos primeiros anos da vida de uma pessoa. Mas gostaríamos de acreditar que um dia este filme se torne uma referência na formação para pais, educadores, profissionais de saúde, gestores, dentre outros. Gostaríamos que este filme fosse indicado por ginecologistas, pediatras, psicólogos, pedagogos, amigos e amigas”, afirma Estela.

Segundo ela, a ideia para o longa-metragem surgiu a partir dos resultados dos filmes Muito Além do Peso, Criança, a Alma do Negócio e Tarja Branca (todos disponíveis gratuitamente em www.videocamp.com). Sua intenção em conhecer a realidade da primeira infância em vários países era apresentar laços de humanidade que unem as pessoas.

“Apesar de ter estado em lugares geograficamente distantes, o que estávamos buscando é o que nos une. E o amor que temos pelos nossos filhos e o que sonhamos pra eles é um laço que nos costura enquanto humanidade”, diz a diretora. “Ouvimos desejos idênticos de pais e mães com relação ao seus filhos, mesmo separados por continentes e classes sociais. Aliás, o que nos une é o que desejamos para nossos filhos. E o que nos separa é a condição que o ambiente nos dá para proporcionar ou não isso para eles.”

Estela Renner: “Gostaríamos de acreditar que um dia esse filme se torne referência na formação de pais, educadores, profissionais de saúde, gestores. E que fosse indicado por ginecologistas, pediatras, psicólogos, pedagogos, amigos e amigas”

O maior desejo de Estela é fazer com que O Começo da Vida seja um agente de transformações sociais. “Gostaríamos que este filme fosse assistido e se tornasse ferramenta de transformação social ­para lideranças políticas, para lideranças empresariais, sociedade civil, amigos e amigas. Enfim, gostaríamos que os conceitos impressos no filme – criatividade, afeto, empatia, direitos humanos, licença parental, parceria, a importância dos relacionamentos com os outros, com a natureza, a beleza, ética e moral, a importância do brincar – fizessem parte da formação de nossa sociedade”, resume.

Um dos temas presentes no longa é a desigualdade social. Leah Ambwaya, ativista pelos direitos das crianças e presidenta da Fundação Terry Children, no Quênia, afirma que “a pobreza nega às crianças muitos dos seus direitos”. O médico Jack Shonkoff, do Centro de Desenvolvimento da Criança da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, declara que não se pode ajudá-las sem ajudar os adultos que cuidam delas. “Crianças não são ajudadas por programas, mas por pessoas. As consequências de não darmos às criancas o que elas precisam custam muito caro para a sociedade”, enfatiza o também professor.

A médica brasileira Vera Cordeiro, fundadora da Fundação Saúde Criança, deixa uma pergunta para reflexão. “Este mundo investe em satélite, em diversas áreas, para conhecer novos planetas e ir para Marte, para a Lua, para Urano… A gente não vai investir na condição humana, na humanidade que está nascendo? Como a gente pode pensar em um mundo de paz, de colaboração, de bem-aventurança onde o começo da vida não é levado em conta?”, questiona.

Em três anos de trabalho, Estela afirma que encontrou em cada bebê a possibilidade de uma nova humanidade. Apesar de O Começo da Vida ser um longa sobre os primeiros anos da infâcia, ele trata sobretudo de afeto, diálogo, aprendizado, empatia, solidariedade, colaboração, criatividade, direitos humanos. E também sobre a importância da brincadeira, o espírito de comunidade, a quebra de papéis de gênero na maternidade e fora dela, sobre como é fundamental incentivar verdadeiramente a amamentação por meio de políticas públicas. É, enfim, uma espécie de chamada global por um futuro mais inclusivo e mais gentil com todos.