Sinal trocado

Para pesquisadores, platô da pandemia comemorado por Doria é ‘assinatura do fracasso’

Pesquisadores avaliam que a pandemia de covid-19 vai se arrastar por muito tempo no platô de São Paulo, que pode chegar a 35 mil mortes em agosto

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As mortes por covid-19 tiveram queda na capital paulista, mas no início de julho a curva começou a crescer de novo

São Paulo – Comemorado pelo governador paulista, João Doria (PSDB), a ideia de que o estado de São Paulo está atingindo um platô da pandemia de covid-19 é vista por pesquisadores como o reconhecimento do fracasso nas políticas de enfrentamento da doença. A ideia de que os números da covid-19 no estado chegaram a um número “estável” e tende a retrair é a aceitação de que será necessário conviver com a doença, internações e mortes por muito tempo. “Alguns dirigentes têm usado esse platô como argumento para dar sustento a suas políticas de relaxamento das medidas de isolamento social. Na verdade, o platô é a assinatura do fracasso”, afirmou o professor titular da Escola de Matemática Aplicada Fundação Getúlio Vargas (FGV), Eduardo Massad.

O matemático participou de uma live com um grupo de pesquisadores para fazer um balanço da pandemia de coronavírus e a perspectiva para o futuro. E as conclusões foram nada animadoras. Modelos matemáticos elaborados por Massad indicam que, nas condições atuais, o estado de São Paulo pode registrar entre 450 mil até 650 mil casos e de 20 mil a 35 mil mortes, até o início de agosto.

“Toda curva epidêmica que se preze, tem que atingir um pico e cair. Essa está mostrando sinais que vai cair, se os 50% (de isolamento) forem mantidos. Como as evidências estão mostrando que o isolamento já caiu para próximo de 40%, é muito provável que essa curva se estabilize nessa toada de 17 mil novos casos por dia”, disse Massad.

Ele também projetou que uma volta às aulas, como quer Doria, no atual momento pode ser “um genocídio”, com até 17 mil crianças menores de cinco anos mortas pela covid-19. Confira a fala do matemático:

Na semana passada, Doria ampliou a flexibilização da quarentena, comemorando a “estabilização” da pandemia. “Estamos ingressando numa fase de platô no estado de São Paulo, depois de um longo período enfrentando o pico. Agora, não apenas na capital, como em todo o estado de São Paulo, estamos ingressando no platô. Isso não significa relaxamento, distensão total e absoluta. Significa atenção redobrada para mantermos o platô em todo o estado de São Paulo e o controle sobre a doença”, disse o governador.

“Embora muitos tenham aí a falsa sensação de que estamos em um momento de inflexão ou platô – da pandemia -, na realidade esses casos ainda devem continuar aumentando. Da mesma forma o número de óbitos deve continuar aumentando”, ressaltou o ex-coordenador do comitê de saúde do governo Doria e presidente do Instituto Butantan, Dimas Tadeu Covas. Ele deixou a coordenação do comitê quando Doria decidiu flexibilizar a quarentena e reabrir o comércio.

Grandes questões

Segundo Dimas, a expectativa é que taxa de transmissão – chamada de RT – na Região Metropolitana de São Paulo deve cair abaixo de 1 apenas em setembro ou outubro. E consequentemente, a curva de epidêmica só vai começar de fato a apresentar queda a partir de outubro ou novembro. Já no interior do estado, “o RT vai encostar em 1 lá para o final de outubro, começo de novembro, o que leva a epidemia para o ano que vem”. O RT é o número de pessoas estimado que podem ser contaminadas por cada caso confirmado.

“E aí vem as grandes questões. Vamos manter essa epidemia por um bom tempo ainda e a taxa de mortalidade, embora possa até estar estabilizada, em um patamar elevado. Estamos tendo em torno de um pouco mais de 300 óbitos por dia no estado de São Paulo, equivalente a um Boing 747, a explosão de um Boing 747 por dia e pode ser que isso se prolongue até o ano que vem. A alternativa a isso seria aumentar as medidas de isolamento a 70% e com isso nós seguramente teríamos uma mudança de comportamento da pandemia e daí nós teríamos, de fato, uma redução importante”, disse Dimas. Confira a fala dele:

O biólogo Paulo Inácio de Prado ressaltou que realmente houve queda no número de novos casos na capital paulista, mas ainda não há segurança de que isso vai se manter.

“Os sinais que a gente vê nos dados ainda são muito incertos. Eles não deixam muito claro se a gente vai ter, nas próximas semanas, a manutenção dessa redução ou uma retomada do crescimento. Tínhamos uma média de cem óbitos por dia e agora temos 75 óbitos por dia. Houve uma redução no número de óbitos, mas ainda temos uma situação muito fora do normal. Não dá para dizer que o platô é um sucesso. O platô é um fracasso, a gente está parado em uma situação muito grave”, afirmou Prado. Confira a análise dele:


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