Audiência pública

Para economista, reforma da Previdência é ‘draconiana, excludente e mentirosa’

Avaliação de Eduardo Fagnani, professor da Unicamp, foi feita durante audiência pública que comparou as atuais regras da Previdência com as modificações propostas pelo governo Temer

Alesp/Divulgação

Audiência pública lotou o auditório da Assembleia Legislativa e reforçou mobilização

São Paulo – “Estão querendo uma reforma que extingue o direito de proteção na velhice. É simples assim.” Foi dessa forma sucinta que Eduardo Fagnani, professor de economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), definiu a proposta de reforma da Previdência do governo de Michel Temer, durante audiência pública ocorrida na manhã dessa quarta-feira (22) na Assembleia Legislativa de São Paulo.

Junto com outros estudiosos do tema, Fagnani é autor dos recentes estudos Previdência: reformar para excluir? e A Previdência Social em 2060: as inconsistências do modelo atuarial do governo brasileiro, publicações que, segundo ele, oferecem alternativas para o debate e analisam cada ponto das mudanças propostas pelo governo federal. “O governo tenta fazer essa reforma baseada na falácia do déficit da Previdência”, afirmou.

Durante o debate, organizado pela bancada do PT na Assembleia, o professor da Unicamp criticou a comparação feita pelo governo Temer com os modelos previdenciários dos países europeus como forma de tentar justificar sua proposta. Para o professor, as regras estabelecidas na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287 são mais exigentes do que as de países desenvolvidos, além da comparação em si ser descabida em função da diferença de contextos.

“Não se pode comparar o Brasil com os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). É uma impropriedade tentar justificar uma reforma dessas comparando com os países europeus, há um oceano de distância”, avaliou, dando como exemplo o fato de a expectativa de vida do homem no Brasil ser, em média, dez anos menor, e a duração da aposentadoria oito anos inferior à dos países da Europa. Fagnani ainda enfatizou que menos de 1% dos 5.561 municípios do Brasil tem o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) semelhante ao de países europeus. “No Brasil, 66% dos municípios têm IDH médio semelhante a Botsuana e Iraque”, destacou.

Em tom irônico, o economista disse que o lema da proposta de Temer deveria ser “reformar hoje para quebrar amanhã” e que o objetivo do governo é desmontar o sistema previdenciário público para beneficiar a previdência privada. “É uma reforma draconiana, excludente e justificada em mentiras.”

Consequências

Antes da participação de Eduardo Fagnani, a pesquisadora do Dieese Patrícia Pelatieri apresentou os detalhes das atuais regras de aposentadoria no país comparando-as com as modificações pretendidas pelo governo Temer. “São modificações amplas, profundas e extremamente prejudiciais para todos os trabalhadores”, pontuou.

Segundo a pesquisadora do Dieese, 79% das pessoas que se aposentaram por idade em 2015 não teriam conseguido obter o benefício se já estivessem em vigor as novas regras previstas na PEC 287, isso por não terem os 25 anos de contribuição agora propostos – atualmente a lei exige o mínimo de 15 anos de contribuição.

Patrícia Pelatieri ponderou que 20% dos trabalhadores não conseguem contribuir mais de seis meses por ano, e que a média de contribuição é de nove meses por ano. Como consequência, para comprovar os 25 anos de contribuição pretendidos pelo governo, o cidadão precisaria trabalhar, em média, 35 anos.      

Presidente da Confederação Brasileira de Aposentados, Pensionistas e Idosos (Cobap), Warley Martins Gonçalles enfatizou a necessidade de atrair a juventude para as manifestações contrárias à reforma da Previdência, considerando que essa parcela da população também será prejudicada. “Se não juntarmos todos, principalmente os jovens, não vamos conseguir brecar essa reforma. Nossa salvação é a rua”, afirmou, destacando também a importância da internet no processo de comunicação e esclarecimento. “Ou nos unimos ou seremos massacrados.”

Para o presidente da CUT-SP, Douglas Izzo, o governo Temer atua para fugir do debate político e não dar tempo das pessoas perceberem o que representam as reformas previdenciária e trabalhista. “Ele quer acelerar o debate no Congresso e fazer em três meses mudanças em conquistas obtidas em cem anos de luta dos trabalhadores”, disse, lembrando a data da primeira greve registrada no Brasil, em 1917.

Douglas afirmou que as centrais sindicais continuarão as mobilizações, mesmo com a “manobra” de Temer de retirar da reforma os servidores municipais e estaduais, um recuo avaliado como estratégia para dividir o movimento de trabalhadores que têm se unido nas manifestações. “O governo quer iludir dizendo que tomar veneno é bom e vai curar os males dos trabalhadores”, criticou, informando que a pressão sobre os deputados e senadores continuará.